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  • Foto do escritorNayara Reynaud

A VIDA EM SI | O narrador pretensioso

Atualizado: 19 de fev. de 2021


Mandy Patinkin, Olivia Cooke, Olivia Wilde e Oscar Isaac em A Vida em Si (2018) | Foto: Divulgação

Com o selo This Is Us (2016-) de sucesso obtido na televisão norte-americana, Dan Fogelman parte para a sua segunda jornada na direção em A Vida em Si (2018), encarando-a como uma questão de vida ou morte, seja por abordar estas temáticas na trama ou na maneira pretensiosa como faz isso. Roteirista de animações, a exemplo de Enrolados (2010), e da ótima comédia romântica Amor a Toda Prova (2011), sua primeira empreitada como diretor de longas foi em Não Olhe para Trás (2015), mas foi com a repercussão da série que criou, cuja história percorre gerações de uma mesma família, que o então cineasta teve o aval para este “grande evento cinematográfico”, como a produção “se autoproclama” na divulgação. Tanto que sua narrativa agora não viaja apenas temporal, mas também fisicamente, cruzando o Oceano Pacífico até Andaluzia, na Espanha.

Assim, Fogelman estrutura seu roteiro em quatro atos, com direito a um prólogo narrado por Samuel L. Jackson como ele mesmo – a primeira das muitas reverências que faz Pulp Fiction: Tempo de Violência (1994) – e repleto de um humor negro que faz o espectador duvidar de tudo que acontece na parte inicial e não se envolver de fato com os personagens no melodrama que vem pela frente. E, revela, que nem ele mesmo se importa de fato com as pessoas criadas por ele neste painel. Uma delas levanta a tese do “narrador não-confiável”, que o roteirista utiliza como desculpa para discursar sobre a falta de confiabilidade que a vida nos proporciona, mas esquece o seu jogo de mudança de ponto de vista para se entregar a uma trama mais previsível do que parece.

O primeiro ato apresenta Oscar Isaac como o depressivo Will, que sofre por não superar a falta da mulher Abby (Olivia Wilde), por motivos que são decifrados depois de muito vaivém na sua sessão de terapia com a subutilizada Annete Benning na pele da psicóloga. O segundo pula para a jovem de 21 anos Dylan (Olivia Cooke) em uma Nova York que não envelhece nada no salto temporal dado, pouco aprofundando-a, além do que já sabemos ao conhecer o passado de sua árvore genealógica.

A narrativa, então, zarpa para a Europa na terceira parte, onde o público conhece Javier (Sergio Peris-Mencheta), sua amada Isabel (Laia Costa, cuja última cena é um dos momentos mais hipnotizantes do filme, ao dar realmente a vida que falta ao texto um tanto artificial) e o patrão dele, encarnado de maneira enigmática por Antonio Banderas. No quarto, é a vez do filho Rodrigo (Àlex Monner), que quando pequeno, sofreu um trauma em Nova York, voltar lá para estudar na universidade.

Sem entregar muito da história, já dá para ligar os pontos somente pela sinopse, tal qual durante a sessão. Sim, o mundo é pequeno e todos conhecem um exemplo pessoal disso, mas as convenções são utilizadas sucessivamente na necessidade de Fogelman em estabelecer conexões é de um exibicionismo roteirístico que incomoda aqueles que ultrapassam o ilusionismo e choro que provoca na plateia. A vida, essa roteirista sacana e refinada, é bem mais surpreendente em suas reviravoltas e clichês, previsível e monótona nos seus ínterins, e paradoxal quanto aos figurantes que a habitam, que pouco se parecem com os protagonistas de seu quase filme coral, apesar do esforço do bom elenco. No entanto, o cineasta ainda precisa frisar isso em um discurso autocondescendente no epílogo.

Traçando um paralelo com o Time Out of Mind (1997), o premiado álbum de Bob Dylan que uma das personagens adora, a narradora fala que a canção romântica Make You Feel My Love foi criticada por ser um ponto estranho no meio do mergulho tão sombrio e denso do ícone do folk no blues, mas que se tornou um sucesso, sendo regravada por pelo cantor country Garth Brooks – e pela cantora pop britânica Adele, embora o longa esqueça justamente de falar desta, que hoje em dia é a versão mais famosa dela. A ideia de usar a referência como justificativa para o seu sentimentalismo cai por terra quando Fogelman faz o inverso do músico. Se a música era um respiro que ressalta a beleza e companheirismo do amor em um disco que fala das dores dele através do alter ego que perdeu sua amada e sua razão, o filme carrega todas as tragédias que abalam os personagens para desaguar em um desfecho romântico superficial e mal construído, que minam tal sentimento após o sadismo nessa condução tragic(ômica).

Trata-se de uma obra muito fácil de se odiar, como os críticos e cinéfilos mais céticos vem fazendo, ou de se amar, a exemplo da reação de boa parte da plateia impressionada com os truques do cineasta que manipula suas emoções e lhes dá lições de vida. Nestes casos, sempre é melhor o caminho do meio para ambos os lados: deixar de lado o cinismo e entender que o longa entrega, ainda que por meios tortos, a reflexão pretendida; ou se sentir tocada(o) pela sua mensagem, mas compreender as falhas do filme.

 

A Vida em Si (Life Itself, 2018)

Duração: 117 min | Classificação: 16 anos

Direção: Dan Fogelman

Roteiro: Dan Fogelman

Elenco: Oscar Isaac, Olivia Wilde, Annette Bening, Mandy Patinkin, Jean Smart, Olivia Cooke, Sergio Peris-Mencheta, Antonio Banderas, Laia Costa, Àlex Monner, Isabel Durant, Lorenza Izzo, Samuel L. Jackson, Jake Robinson e Adrian Marrero (veja + no IMDb)

Distribuição: Paris Filmes

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