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  • Foto do escritorNayara Reynaud

É TUDO VERDADE 2021 | Dia 5 – A mulher e o mundo

Atualizado: 20 de mai. de 2021


Nesta terça (13), a 26ª edição do É Tudo Verdade investe em retratos de mulheres que são obrigadas a enfrentar um mundo contra elas nos longas das mostras competitivas programados para este quinto dia de festival. A competição internacional apresenta a animação Vicenta (2020), documentário argentino de Darío Doria que acompanha a luta de uma mãe pobre contra o Estado para que a sua filha deficiente tenha o direito de interromper sua gravidez, fruto de um abuso. Depois, estreia Alvorada (2020) na seleção nacional, com a visão de Anna Muylaert e Lo Politi sobre os dias em que a então presidente Dilma Rousseff, primeira e única mulher a governar o Brasil, aguardava e se defendia do processo de impeachment, direto do Palácio da Alvorada. Veja mais sobre os filmes a seguir:

 

Vicenta (Vicenta, 2020)


Cena do documentário de animação argentino Vicenta (2020), de Darío Doria | Foto: Divulgação (É Tudo Verdade)

No nosso texto sobre o filme de abertura deste ETV 2021, Fuga (2021), comentamos sobre o fato de animações documentais pouco adentrarem a seleção do festival. Este ano, porém, a curadoria não trouxe o gênero apenas nas lembranças de um refugiado afegão revividas por traços animados na produção franco-nórdica, como também no stop motion do longa argentino Vicenta, de Darío Doria. O título que integra a competição internacional usa a técnica para construir um docudrama da batalha travada pela mulher do título: uma mãe pobre e analfabeta contra diversas instituições do Estado que tentaram impedir o direito legal de interromper a gravidez de sua filha, uma jovem deficiente que foi abusada, no que ficou conhecido na Argentina como o caso LMR.


Assim, com a voz da cantora Liliana Herrera relembrando a história, do ponto de vista de Vicenta, o público retorna a 2006, quando a empregada doméstica que vive em um barracão paupérrimo em Guernica, uma região periférica da área metropolitana de Buenos Aires, descobre que sua filha Laura, cujo atraso cognitivo de seus problemas de crescimento lhe conferia a idade mental de uma criança de oito anos, mesmo tendo 19 anos na época, estava grávida. Depois de muito explicar e tentar extrair informações da jovem, a mãe descobre que foi o Tio Luís quem “mexeu” com ela e, graças ao médico que as atendeu no primeiro exame, descobre que a lei argentina dava direito ao aborto em casos de abuso de incapaz. A senhora e sua outra filha Valéria começam, então, uma peregrinação por juizados e hospitais, mas a burocracia estatal e o preconceito e valores religiosos de agentes de diversas instituições colocam empecilhos constantes na realização do procedimento – o espectador brasileiro certamente se lembrará do caso recente e semelhante, em partes, ocorrido no ano passado em São Mateus, no Espírito Santo, que gerou manifestações contra e a favor da interrupção da gravidez de uma criança de 10 anos, estuprada pelo tio.


A animação serve, portanto, a vários intuitos na obra, sendo o primeiro deles preservar a identidade das personagens, que tem alguns de seus nomes alterados. Também para preencher as lacunas do drama enfrentado pela família desde o princípio, antes de ser noticiado e se tornar midiático, como demonstra o bom uso das imagens de arquivo de reportagens da época sendo transmitidas nas televisões deste universo de massinha tão bem construído pela direção de arte de Mariana Ardanaz. Tanto o trabalho dela quanto a direção de Doria, que investe em travellings nas maquetes e um tenso desenho de som, garantem doses equilibradas de realismo e ludicidade no horror do mundo que as cerca e do qual Vicenta fez questão de ser uma agente de mudança.

 

Vicenta (Vicenta, 2020)

Duração: 69 min | Classificação: 12 anos

Direção: Darío Doria

Produção: Argentina

Áudio e Legendas: espanhol | legendas em português

> Sessão – 13/04/2021 (segunda), às 19h00

Disponível no Looke, com limite de até 2.000 visualizações ou prazo de 24 horas; caso não alcancem o limite, retornam no dia seguinte às 12h00 e ficam até as 22h ou o limite de visionamentos estabelecido

 

Alvorada (2020)


A ex-presidente Dilma Rousseff em cena do documentário nacional Alvorada (2020), de Anna Muylaert e Lo Politi | Foto: Divulgação (É Tudo Verdade)

Quase cinco anos após suas filmagens, o documentário Alvorada, de Anna Muylaert e Lo Politi, chega ao público da 26ª edição do ETV com o peso de sentir-se datado. Depois do impeachment da presidente Dilma Rousseff, em 2016, tanta coisa que aconteceu na política brasileira que seria possível realizar temporadas de uma série documental para abarcar as reviravoltas diárias nas notícias vindas dos Três Poderes. Além disso, aquele momento foi objeto de outros longas-metragens do gênero, como O Processo (2018), de Maria Augusta Ramos, e Democracia em Vertigem (2019), de Petra Costa, que repercutiram bastante quando dos seus lançamentos.


Contudo, a princípio, a passagem do tempo não necessariamente seria um impeditivo para a produção soar como novidade em 2021. A abertura apenas com o som do voto do então deputado federal Jair Bolsonaro a favor do impeachment, com direito à exaltação do torturador de Dilma, quando esta foi da luta armada durante a Ditadura, até sugere que as diretoras pretendem mostrar as consequências desse passado recente no terrível cenário atual do país. No entanto, nenhuma análise política ou contextualização com a atualidade advém da narrativa, que também não traz aspectos novos quanto ao que ocorreu nos bastidores da defesa da presidente ou traça linhas de discurso contundentes, além da questão do machismo implícito na decisão de derrubar a primeira e única mulher a governar o Brasil – toda reflexão adicional vem mais do espectador do que é provocada pelo longa.


Esquivando-se, portanto, de comparações com as verves analítica e partidária dos já citados documentários, Alvorada busca uma nova visão dos fatos ao fazer da morada oficial dos Presidentes da República, desde a fundação de Brasília, um coprotagonista junto de Rousseff, como o próprio título infere. Falta, porém, um rigor narrativo para que a observação dos dois objetos os torne complementares, resultando, na verdade, em um panorama incompleto de ambos. Aliás, falta também um rigor estético, já que, a despeito da qualidade dos profissionais envolvidos e da bela entrada dramática com as cortinas ao som da Sinfonia Nº 10, de Heitor Villa-Lobos – o compositor está presente em praticamente toda a trilha –, a captação de som irregular e a câmera trêmula não conseguem construir o discurso de um “cinema de guerrilha”, dando apenas a impressão de amadorismo por parte da produção.


Por fim, assim como não conseguem acessar a intimidade da então mandatária do país que, por diversas vezes, pede que pare a gravação, Muylaert e Politi não se aproximam, de fato, do cotidiano no Palácio da Alvorada. Os planos exploram mostram seus espaços, mas não os exploram dentro da magnitude e possível obsolescência das linhas projetadas por Oscar Niemayer; as sequências apontam dinâmicas diárias de trabalho, mas sem apresentar de verdade seus trabalhadores. Somente no final o documentário encontra aquilo pelo qual estava procurando enquanto vagueava pelo edifício, nas palavras de Dilma sobre o Diabo e o Mal na visão do pensador John Milton (1608-1674) que refletem indiretamente seu pensamento sobre o que estava passando e, especialmente, no representativo registro da equipe de limpeza feminina preparando a casa para o novo dono e ocupando a cadeira vaga de governo de um que mal olha para elas e tantos outros que, realmente, formam este país.

 

Alvorada (2020)

Duração: 90 min | Classificação: Livre

Direção: Anna Muylaert e Lo Politi

Produção: Brasil (São Paulo/SP)

Áudio e Legendas: português | legendas em inglês

> Sessão – 13/04/2021 (terça), às 21h00

> Reprise – 14/04/2021 (quarta), às 15h00

Disponível no Looke, com uma hora de tolerância para o início da sessão ou até atingir o limite de 1.000 visualizações

> Debate – 14/04/2021 (quarta), às 17h00

Disponível no YouTube do ETV


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