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  • Foto do escritorNayara Reynaud

OBSESSÃO | Como desgrudar um chiclete

Atualizado: 26 de fev. de 2021


Chloë Grace Moretz e Isabelle Huppert em cena do thriller Obsessão (Greta, 2018) | Foto: Divulgação (Galeria Distribuidora)

Adjetivar Obsessão (2018) como um longa-metragem anacrônico, talvez, não dê conta dos vários tipos de desalinhamentos deste típico thriller noventista realizado por Neil Jordan em pleno final da segunda década do século XXI. Há o fato do novo trabalho do cineasta irlandês ser ambientado em Nova York, mas filmado em Dublin e Toronto, porém isso é o de menos para o título que estreou no último Festival de Toronto. A discrepância entre sua equipe e elenco classe A, capitaneada por Isabelle Huppert e Chloë Grace Moretz, e seu roteiro de filme B, é aquilo que mais chama atenção nesta produção.

Tudo começa de forma promissora, com uma bolsa largada no metrô nova-iorquino, encontrada pela recém-chegada Frances McCullen (Chloë Grace Moretz), que, após ver fechada a seção de Achados e Perdidos, decide entregar ela própria o objeto para a sua dona, Greta (Isabelle Huppert). A garota que divide um loft em Tribeca com a sagaz e cética Erica (Maika Monroe) é simplesmente prestativa e inocente, mas é vendida a ideia de que isso decorre de sua visão de vida interiorana, sendo que ela vem de outra grande metrópole, que é Boston. De qualquer modo, a jovem que ainda sente a falta da mãe, cuja morte motivou a sua mudança e distanciamento do pai (Colm Feore), acaba logo se afeiçoando à viúva e pianista, que também sofre por estar longe da filha, mas a relação maternal que se estabelece entre as duas traz as suas surpresas, que são previsíveis até para quem não viu o trailer que entrega quase toda a história.

É possível cogitar que, assim como o público, este bom elenco esperava algo melhor vindo da grife de Neil Jordan. Justiça seja feita, o diretor de Entrevista com o Vampiro (1994) e Valente (2007) constrói um filme visualmente intrigante, se beneficiando do senso estético sempre apurado de Seamus McGarvey na fotografia, a exemplo do uso do metrônomo marcando a tensão de certas cenas ou da sequência no elevador. No entanto, é do roteirista que ganhou o Oscar na categoria com Traídos pelo Desejo (1992) que se sente falta neste trabalho que assina com Ray Wright, responsável pelos roteiros de A Epidemia (2010) e Caso 39 (2009).

Com a proposta de trazer esta dinâmica obsessiva tão comum nos suspenses para um protagonismo totalmente feminino, o cineasta acaba atingindo um efeito contrário por causa da falta de desenvolvimento dessas personagens. No início, ele trabalha, através dos planos, uma possível tensão sexual entre Frances e Greta, mas isso é tão logo abandonado quanto os temas que poderiam ser aprofundados nesta história, seja na própria obsessão surgida da ideia de substituir alguém que lhe faz falta ou na necessidade de encontrar uma conexão na solidão da vida na cidade grande. Sem dar tempo para a construção dessa relação das duas, a trama da stalker surge sem construção suficiente em um roteiro repleto de convenções conhecidas e, particularmente, de furos nas resoluções do terceiro ato – toda a participação de Stephen Rea, o ator coringa do diretor, como um detetive particular é o melhor exemplo disso.

Diante dessas fragilidades, uma solução para Obsessão poderia ser se assumir como um filme B, mas Jordan está muito imbuído da ideia de prestar uma homenagem ao gênero, emulando de Brian De Palma a vários thrillers dos anos 1990, que intercala as chaves sem equilíbrio entre tirar proveito dos clichês quase parodiando-os e se levar a sério demais. Mais ciente da situação, está Huppert na pele de uma senhora psicopata, entre chicletes, passos de dança e seringas. Se Moretz tenta tirar o que pode de sua protagonista e Monroe entrega as melhores falas de sua personagem unidimensional, é a atriz francesa que se entrega ao momento sem pudor e convida o espectador a tentar se divertir tanto quanto ela.

 

Obsessão (Greta, 2018)

Duração: 98 min | Classificação: 14 anos

Direção: Neil Jordan

Roteiro: Ray Wright e Neil Jordan, com argumento de Ray Wright

Elenco: Isabelle Huppert, Chloë Grace Moretz, Maika Monroe, Colm Feore, Stephen Rea, Zawe Ashton, Jeff Hiller e Thaddeus Daniels (veja + no IMDb)

Distribuição: Galeria Distribuidora

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