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  • Foto do escritorNayara Reynaud

TAL PAI, TAL FILHA | Um oceano de distância

Atualizado: 9 de mai. de 2020


Kelsey Grammer e Kristen Bell em Tal Pai, Tal Filha (2018) | Foto: Divulgação

O cenário é Central Park e um casamento está prestes a acontecer no parque mais famoso de Nova York, cidade que já foi palco de tantas comédias românticas, como Tal Pai, Tal Filha (2018) parece ser mais uma, a princípio. Mas, se por trás da alegria do soul da Motown e do canto das “meninas” do The Supremes, Come See About Me fala em sua letra das dores e medos de alguém que o eu lírico teme nunca retornar, há ali na música que abre o filme produzido pela Netflix o indício de que o cerne e o tom dele não serão necessariamente os esperados. Logo, o matrimônio não se realiza e, ao mesmo em que Rachel (Kristen Bell) tem de lidar com a rejeição de Owen (Jon Foster) no altar por ser tão workholic e viciada em celular mesmo nos momentos que pedem desconexão, a noiva ainda tem a surpresa de, no meio de tudo isso, (re)ver o seu pai, Harry (Kelsey Grammer), o qual vive afastado dela há mais de 25 anos.

Em seu primeiro longa na direção, Lauren Miller Rogen, que já estrelou e roteirizou a comédia Para se Divertir, Ligue... (2012), navega mais pelo drama do que necessariamente pelo terreno que ela mais conhece, em uma escolha que, às vezes, perde oportunidades, mas mostra uma bem-vinda contenção em favor de seu tema. Típica produção que não te arranca risos, porém, faz a maior parte do público assistir entre uma lágrima no olho e um sorriso no rosto, a virada de sua trama acontece quando, por culpa do álcool, pai e filha vão parar no cruzeiro em que comemoraria a sua lua-de-mel.

E justamente por estar neste ambiente de um hotel gigantesco em alto-mar e não fazer nenhuma piada com isso, está aí a principal chance desperdiçada pelo longa. Se havia o merchandising nada discreto da MSC nos dois S.O.S. Mulheres ao Mar (2014 e 2015), aqui o comercial da Royal Caribbean é ainda mais direto, embora mais integrado à trama. Não ocorre intemperes neste cruzeiro, todas as atividades são estimulantes e o passeio se faz o lugar ideal para a reconciliação que se espera entre os protagonistas, que tem como companheiros de mesa recém-casados escolhidos a dedo (um casal gay vivido por Paul W. Downs e Zach Appelman, um da 3ª idade com Mary Looram e Anthony Laciura, e um negro com Blaire Brooks e Leonard Ouzts) para apresentar uma aparente diversidade – contudo, não hesitar em recorrer a estereótipos no retrato da Jamaica.

Entre os passageiros do navio, também existe Jeff (Seth Rogen, casado com a diretora e adotando uma atuação bem mais contida), um professor canadense tentando curar as feridas de uma separação e que se aproxima da publicitária nova-iorquina. No entanto, quando se pensa que o filme vai desviar seu caminho para os relacionamentos amorosos dela, ele se fortalece da metade para frente, focando em sua espinha dorsal já anunciada no título e conferindo mais humanidade a essa tentativa de reconstrução de uma relação paternal perdida há tanto tempo. Mais reconhecidos por seus trabalhos na TV – ela especialmente por Veronica Mars: A Jovem Espiã (2004-07) e The Good Place (2016-), ele por ter sido o Dr. Frasier Crane por 20 anos nas comédias Cheers (1982-93) e Frasier (1993-2004) –, Bell foge da figura cômica pela qual é tão conhecida e da armadilha de armar sua personagem com uma raiva histérica, enquanto Gramer instiga empatia como um homem que sabe seus erros ao não saber como assumir de fato a sua paternidade, mas que carrega a solidão e outras perdas neste ínterim.

Lauren, que também assina o roteiro com o Anders Bard, evita se arriscar e não vai além de pequenas subversões narrativas em uma trama de clichês não-ofensivos à inteligência do público – até quando a obviedade vem em forma de música, com Come Sail Away da banda setentista Styx, tira-se sarro disto. Sem querer, já que este não é o foco que o longa quer suscitar, é sensível também como a sociedade julga com pesos diferentes a ausência paterna do que a materna, mas Tal Pai, Tal Filha se coloca como aquele produto que você vai ver de modo descompromissado – especialmente em uma data especial, como este Dia dos Pais. No entanto, o seu compromisso se mostra como algo muito mais amplo em Hollywood: no oceano da Netflix, repleto de longas originais que ficam entre a ficção científica, particularmente distopias, e as comédias de Adam Sandler, a plataforma de streaming tem seguido para mares diferentes com a comédia romântica O Plano Imperfeito (2018) e esta dramédia, reencontrando estes gêneros entre os filmes médios, esquecidos em um cenário polarizado entre os blockbusters e as produções voltadas para festivais e premiações.

 

Tal Pai, Tal Filha (Like Father, 2018)

Duração: 98 min | Classificação: 16 anos

Direção: Lauren Miller Rogen

Roteiro: Lauren Miller Rogen, com argumento de Anders Bard e Lauren Miller Rogen

Elenco: Kristen Bell, Kelsey Grammer, Paul W. Downs, Zach Appelman, Seth Rogen, Mary Looram, Anthony Laciura, Blaire Brooks, Leonard Ouzts, Brett Gelman e Jon Foster (veja + no IMDb)

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