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  • Foto do escritorNayara Reynaud

ADAM | Bendito é o fruto

Atualizado: 28 de fev. de 2021


Lubna Azabal e Nisrin Erradi em cena do filme Adam (2019), de Maryam Touzani | Foto: Divulgação (Arteplex Filmes)

A seção Un Certain Regard, mais importante mostra paralela do Festival de Cannes, foi marcada nesta 72ª edição por retratos femininos bem íntimos como o do filme vencedor do prêmio principal, o brasileiro A Vida Invisível (2019), ou do argelino Papicha (2019). Tal olhar também se viu no marroquino Adam (2019), que, assim como as outras produções citadas, representa o seu país na disputa por uma vaga na categoria de Melhor Filme Internacional no Oscar. E uma das razões para isso não se encontra somente na direção e no roteiro de Maryam Touzani, mas no fato da cineasta ter se inspirado na história de uma jovem que conheceu e foi acolhida por seus pais para criar este seu primeiro longa.

Trocando sua cidade natal de Tânger por Casablanca como cenário, a diretora inicia a narrativa com a jovem Samia (Nisrin Erradi) procurando por emprego e abrigo de casa em casa, para então revelar, ao abrir o plano, que o motivo de tanta recusa esteja visível em seu corpo, já que se encontra grávida. Uma das negativas recebidas por ela vem de Abla (Lubna Azabal) que, diferente da receptiva e simpática filha Warda (Douae Belkhaouda) com quem mora sozinha, fecha a cara e a porta para a moça. No entanto, uma longa noite lhe traz um peso na consciência e faz a viúva acolher a garota para dentro de seu lar, onde tem uma padaria e confeitaria caseira, em um gesto que transformará a vida de todas.

Em comparações inevitáveis, Adam trata o peso da gravidez fora do casamento no Marrocos e nas sociedades islâmicas, em geral, de forma mais indireta e comedida em seu drama do que Sofia (2018), longa compatriota de Meryem Benm'Barek que ganhou o prêmio de Melhor Roteiro na mesma Un Certain Regard do ano passado ao abordar o mesmo tema, ou o próprio Papicha, que o discute pontualmente. Isto reside já na estrutura narrativa proposta por Touzani que suprime qualquer tipo de conflito ou falas mais diretas, com exceção de uma insinuação no comportamento das vizinhas de bairro, sobre o tratamento dado às mulheres nesta situação, contando com o breve conhecimento do público de como funciona a sociedade marroquina ou as islâmicas, em geral, para entender o não-dito no subtexto. E tal qual a janela da padaria que não revela tudo que se acontece dentro da padaria de Abla, o roteiro não entrega ao espectador os detalhes de como aconteceu a gravidez de Samia, apenas deixando claro sua intenção de dar o filho à adoção e poder voltar a sua família e sua aldeia como se nada tivesse acontecido, pois disse aos pais que estava trabalhando em um salão de beleza na cidade.

Apesar da resistência da viúva, as duas começam a desenvolver laços afetivos uma com a outra, em uma relação que ganha um frescor no segundo ato, mas retorna ao drama no último. Ainda sim, a grande contenção da diretora evita o sentimentalismo, mesmo que, por conta disto, limite o envolvimento completo com as personagens em alguns momentos. É como se o filme se fechasse igual as suas protagonistas – Abla por causa do luto e Samia por se recusar a criar um vínculo que seria logo desfeito com o filho –, mas a câmera de Touzani e da diretora de fotografia Virginie Surdej conseguisse encontrar, nas brechas de seus closes, a intimidade que surge do encontro dessas mulheres solitárias em seu refúgio – ou na criação de um novo mundo, como sugere o nome da criança, presente tanto na Bíblia quanto no Corão.

 

Adam (Adam, 2019)

Duração: 98 min | Classificação: 12 anos

Direção: Maryam Touzani

Roteiro: Maryam Touzani

Elenco: Lubna Azabal, Nisrin Erradi, Douae Belkhaouda, Aziz Hattab e Hasnaa Tamtaoui (veja + no IMDb)

Distribuição: Arteplex Filmes

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