top of page
  • Foto do escritorNayara Reynaud

LONGA JORNADA NOITE ADENTRO | Fria é a noite

Atualizado: 26 de fev. de 2021


Jue Huang em cena do filme chinês Longa Jornada Noite Adentro (2018), de Bi Gan | Foto: Divulgação (Zeta Filmes)

Exibido na mostra Un Certain Regard do Festival de Cannes do ano passado, o novo filme do jovem cineasta chinês Bi Gan é uma Longa Jornada Noite Adentro (2018) que nem todos podem achar suficientemente recompensadora ao seu final.

A questão não está na duração de duas horas e dezoito minutos do segundo longa-metragem do diretor de Kaili Blues (2015), mas em uma pergunta quase existencial que, vez ou outra, atinge a cinefilia, seja ela de realizadores, da crítica ou do público. O que importa mais: a forma ou o conteúdo? Investir em tal cisão é inútil, já que o cinema é uma expressão combinada de ambos, mas filmes divisivos como este, que pendem radicalmente para um dos lados, sempre levantam o mesmo questionamento.

Com uma vaga busca do protagonista Luo Hongwu (Jue Huang) por sua amada Wan Qiwen (Wei Tang, conhecida por Desejo e Perigo, obra assinada por Ang Lee em 2007), na província interiorana de Kaili, terra natal de Bi Gan que volta a ser cenário de seu trabalho, a trama procura não a ordem e sim a desorientação para guiar o espectador. Não é difícil que este se encontre confuso – e com razão – durante a sessão, com a narrativa entrecortada que mal apresenta os personagens e suas relações. Na narração, fala-se das memórias que mentem, mais do que a própria ficção, e o cineasta deliberadamente brinca com a plateia, perdida tentando entender o que é verdade, o que é uma falsa lembra ou sonho naquela história.

O longa adquire uma qualidade ainda mais etérea quando entra em seu principal chamariz: o plano-sequência em 3D de 50 minutos. Passada mais de uma hora de filme, Luo adentra uma sala de cinema e põe os óculos 3D como um indicativo para o público também colocar o acessório e mergulhar nesta viagem ininterrupta, delimitada também pela cartela com o título da produção franco-chinesa que só surge no início desta segunda metade. A câmera deslizante do cineasta e a fotografia compartilhada por Yao Hung-I, Dong Jinsong e David Chizallet – respectivamente, de Missing Johnny (2017), Carvão Negro, Gelo Fino (2014) e Cinco Graças (2015) – já são belas no encanto sensual pelo qual percorrem os ambientes, mas é inevitável não se espantar pela coreografia trabalhada na mise-en-scène da longa tomada única, com uso combinado de steadycam, drones e até uma descida de teleférico, por exemplo.

Apesar de assumidamente ter o noir Pacto de Sangue (1944), de Billy Wilder, como inspiração inicial, o roteiro pouco guarda as características do gênero, com alusões à máfia, uma espaça investigação e uma nova figura da femme fatale nesta mulher tão desejada e sonhada. A referência mais óbvia ao cinéfilo, porém, vem da paleta de cores, especialmente em tons neon, e desta paixão mais duramente impossibilitada do que romanticamente impossível, que logo remetem à temática e estética caras ao compatriota de Hong Kong, Wong Kar Wai. No entanto, sem conseguir gerar envolvimento emocional naquele amor que está longe de ser à flor da pele, Bi Gan entrega uma Longa Jornada de beleza hermética, provando que a abstração de uma narrativa formal de nada adianta se os sentidos e sentimentos mais abstratos do espectador não são aguçados por esta experiência.

 

Longa Jornada Noite Adentro (Di qiu zui hou de ye wan, 2018)

Duração: 13 min | Classificação: 12 anos

Direção: Bi Gan

Roteiro: Bi Gan

Elenco: Tang Wei, Huang Jue, Sylvia Chang, Lee Hong-Chi e Yongzhong Chen (veja + no IMDb)

Distribuição: Zeta Filmes

0 comentário

Posts Relacionados

Ver tudo
bottom of page