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  • Foto do escritorNayara Reynaud

O MENINO QUE QUERIA SER REI | O país que não sabia o que queria

Atualizado: 24 de fev. de 2021


Louis Ashbourne Serkis em cena de O Menino que Queria Ser Rei (2019) | Foto: Divulgação

Se, nos últimos anos, as tentativas de atualizar mitos britânicos não foram bem sucedidas, muito se deve ao caminho que Rei Arthur: A Lenda da Espada (2017) e Robin Hood – A Origem (2018) tomaram neste processo. Sem se apoiar na velocidade dos movimentos de câmera e cortes nem em protagonistas tirados de qualquer academia de cross fit para um cenário medieval, Joe Cornish leva a lenda para a Londres contemporânea e a ação para um grupo de pré-adolescentes e adolescentes em seu segundo longa, mas é a utilização da história clássica para falar de temas pertinentes e atuais que faz de O Menino que Queria Ser Rei (2019) um filme mais bem sucedido neste sentido. O rei que uniu a Bretanha serve de inspiração à trama que demonstra como a produção infanto-juvenil do Reino Unido tem sido o filão do cinema local que aborda de maneira mais direta, ainda que lúdica, a problemática do Brexit – vide Paddington 2 (2017) que aprofunda o discurso do primeiro de aceitação da diferenças com o seu simpático urso imigrante.

Aqui, o protagonista é Alex (Louis Ashbourne Serkis, filho do “mago” das performances por captura de movimentos, o ator Andy Serkis), um garoto de 12 anos criado somente pela mãe (Denise Gough) e que tem em um livro do Rei Arthur, deixado pelo pai, uma forma de suprir a figura paterna ausente. Mas quem diria que a história sairia das páginas e se confundiria com a sua própria vida quando, fugindo de Lance (Tom Taylor) e Kaye (Rhianna Dorris), dois colegas de escola que perseguem ele e seu melhor amigo Bedders (Dean Chaumoo), ele se depara com uma espada na pedra de uma construção e retira nada menos do que a Excalibur. Daí surge um mago Merlin adolescente (o filho da também atriz Celia Imrie e quem rouba a cena, Angus Imrie), que por vezes adquire a forma de uma pomba ou de um sábio Patrick Stewart e lhe alerta para a insurgência de Morgana (Rebecca Ferguson), a feiticeira meia-irmã de Arthur que pretende controlar a Terra, que só o menino pode ser capaz de deter.

Assim, Joe Cornish implementa novamente a mistura de aventura juvenil com fantasia e ficção científica que tornou seu primeiro longa, Ataque ao Prédio (2011), um filme cult para alguns, tendo em mãos um orçamento maior. No entanto, não são os efeitos especiais – mais genéricos nas aparições e ambientação da Morgana do que nos cavaleiros de esqueleto – que chamam a atenção na produção e sim a narrativa envolvente que o comediante e roteirista parceiro do cineasta Edgar Wright entrega em uma trama que segue caminhos já conhecidos pelo público. Os próprios personagens brincam com a similaridade dos seus passos com os de outras histórias de sucesso que seguem a Jornada do Herói, descrita pelo escritor Joseph Campbell, em citações pop a Harry Potter, Senhor dos Anéis e Star Wars. Há também um ar que remonta a clássicos spielberguianos do gênero, como Os Goonies (1985) e E.T. – O Extraterrestre (1982), e títulos que se inspiraram neles, algo declarado na própria trilha sonora assinada pelo coletivo inglês Electric Wave Bureau que traz sinterizadores oitentistas e uma reminiscência medieval às suas composições.

No entanto, é no seu senso de contemporaneidade que O Menino que Queria Ser Rei eleva o nível e encontra sua própria voz. De um tema urgente e sempre debatido com o público-alvo, o filme não só faz o seu discurso contra o bullying como questiona um país sem rumo, com os debates no Parlamento britânico se alongando sem que se saiba como e se será realizada a retirada do Reino Unido da União Europeia em 29 de março de 2019, como estava marcado. A desunião permitiu que Morgana, aqui como apresentação de todo e qualquer mal, ganhasse força e a narrativa faz questão de frisar uma divisão prejudicial, seja no microcosmo da Dungate Academy ou de maneira macro ao falar de uma nação dividida, sendo necessário que lados oponentes dentro da dinâmica escolar se juntem para um bem comum. Assim como Cornish usou, em seu début, a violência no sul de Londres como pano de fundo e alegoria quando um grupo de adolescentes defendia seu prédio de uma invasão alienígena, o cineasta mantém a esperança na juventude, especialmente diversa no seu quarteto de combatentes, ao olhar para o passado bretão e um possível futuro apocalíptico pós-Brexit.

 

O Menino que Queria Ser Rei (The Kid Who Would Be King, 2019)

Duração: 120 min | Classificação: Livre

Direção: Joe Cornish

Roteiro: Joe Cornish

Elenco: Louis Ashbourne Serkis, Dean Chaumoo, Tom Taylor, Rhianna Dorris, Angus Imrie, Denise Gough, Rebecca Ferguson, Patrick Stewart, Nathan Stewart-Jarrett, Noma Dumezweni e Mark Bonnar (veja + no IMDb)

Distribuição: 20th Century Fox (Fox Film do Brasil)

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