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  • Foto do escritorNayara Reynaud

YARA | O estranho que nós amamos

Atualizado: 24 de fev. de 2021


Michelle Wehbe e Elias Freifer em cena do filme franco-iraque-libanês Yara (2018) | Foto: Divulgação (Zeta Filmes)

Quando transferiu a trama do interior da França, cenário que era a ideia inicial de seu novo filme, para as montanhas no norte do Líbano, o diretor iraquiano Abbas Fahdel mudou também o tempo e atmosfera de Yara (2018). O clima idílico poderia até estar no conceito original, mas nesta paisagem bem afastada da imagem que costuma se associar ao Oriente Médio, a contemplação se faz necessária. Mais que isso, ela é dominante na abertura da produção exibida no Festival de Locarno, com o registro quase documental do cotidiano naquela vila esquecida entre o vale e os montes.

A câmera observa os gatos pela casa, as galinhas no quintal, as cabras pastando e até as moscas voando, enquanto a adolescente Yara (Michelle Wehbe) estende as roupas no varal em frente à bela vista que ela, sua avó (Mary Alkady) e poucos mais compartilham. Grande parte dos habitantes do lugarejo, de maioria católica, morreu – assim como os pais da jovem – ou foi embora. Os restantes passam de vez em quando para trazer alimentos e suprimentos para as duas ou dar uma ajuda com os animais e afins.

É quando chega um forasteiro, o jovem Elias (Elias Freifer) para arrebatar o coração da moça e introduzir mais o espectador dentro daquele ambiente. Se há traços do cinema iraniano na direção, a junção do estilo e da trama pode dar à obra um ar de Jafar Panahi menos humorado e mais romântico filmando Unicórnio (2017). No entanto, além de avó e neta não estarem totalmente isoladas nas montanhas como mãe e filha da produção nacional, ambos os filmes não poderiam ser mais distantes em seus altos e baixos: a irregularidade que pode dar um aspecto amador ao minimalismo de Fahdel é o oposto do virtuosismo da fotografia e do colorista do longa de Eduardo Nunes, enquanto a ingenuidade cativante desse amor pueril que faz o público se interessar pela singela história contrasta com o hermetismo do trabalho do brasileiro.

O tempo de inocência, porém, é quebrado aos poucos no terceiro ato, quando os moradores da região passam a comentar sobre sua aproximação do rapaz, demonstrando seu machismo velado sob os conselhos e resoluções para a vida da garota. Se Elias chega já falando do seu desejo de ir para a Austrália, ele mesmo, com seu estilo urbano, é a representação de um mundo lá fora a se descobrir para Yara, que nem celular tem. Neste contraste, a simplicidade desse conto de amor veraneio revela uma geração, não só libanesa, mas de todo o mundo árabe, que se apaixona pela modernidade tendo seus pés fincados em uma sociedade de visões arcaicas, e igualmente registra um tempo da natureza que está se perdendo por causa destes mesmos avanços.

 

Yara (Yara, 2018)

Duração: 101 min | Classificação: Livre

Direção: Abbas Fahdel

Roteiro: Abbas Fahdel

Elenco: Michelle Wehbe, Elias Freifer, Mary Alkady, Elias Alkady e Charbel Alkady (veja + no IMDb)

Distribuição: Zeta Filmes

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