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  • Foto do escritorNayara Reynaud

O PACIENTE – O CASO TANCREDO NEVES | Caso Verdade Especial

Atualizado: 13 de fev. de 2021


Otávio Müller, Leonardo Medeiros, Esther Góes, Othon Bastos, Emiliano Queiroz e Paulo Betti em cena de O Paciente – O Caso Tancredo Neves (2018)

Tendo no currículo ene filmes de caráter biográfico, desde o seu clássico O Homem da Capa Preta (1986) a Mauá – O Imperador e o Rei (1999) e Zuzu Angel (2006), além de casos reais ficcionalizados como em Salve Geral (2009) e no recente Em Nome da Lei (2016), o cineasta Sérgio Rezende demonstra mais uma vez a sua predileção, mas de um modo muito pontual e particular. Seu novo longa se apega a um período muito específico da vida do político Tancredo Neves, de três dias antes de sua posse como Presidente da República, quando começara a sentir fortes dores abdominais, passando por sua internação na véspera, às semanas de agonia dele e do país enquanto permaneceu no(s) hospital(is) até a sua morte em 21 de abril de 1985. Só que este ambiente hospitalar confere uma abordagem diferente na sua filmografia até então, fazendo de O Paciente – O Caso Tancredo Neves (2018) uma espécie de episódio estendido de uma série médica, na qual os profissionais na sala de cirurgia são incompetentes e/ou egocêntricos o suficiente para não salvar nem o ser humano nem a figura pública ali na maca.

Com a narração inicial de Silvio Guindane, o que se segue depois da abertura é quase um docudrama sem entrevistas, desenvolvido pelo roteirista Gustavo Lipsztein, com base no livro homônimo de Luís Mir, historiador e pesquisador médico espanhol radicado no Brasil que publicou seu estudo dos prontuários do caso em 2010. Se por um lado, o roteiro tem uma verve documental sendo dramatizada, em conjunto, em seu aspecto ficcional, se assume como um drama médico construído a partir da estrutura de uma comédia de erros, embora o seu viés cômico só desponte na superfície em momentos pontuais. Se a teimosia de Tancredo, interpretado aqui por Othon Bastos, dificultou o atendimento no início, são detalhados também os erros sequenciais dos médicos envolvidos – Dr. Pinheiro Rocha (Leonardo Medeiros), Dr. Renault (Otávio Müller), Dr. Freire (Elcir de Sousa) e, depois, o Dr. Pinotti (Paulo Betti) diretamente de São Paulo –, a precariedade do Hospital de Base de Brasília comandado por Dr. Gilberto Assis (Leonardo Franco), o ego destes profissionais e os interesses políticos em torno disso minaram a saúde do então primeiro presidente eleito, ainda que indiretamente, após anos de Ditadura no país.

Em um dos breves momentos em que Rezende se utiliza de imagens de arquivo da época, um “povo fala” de uma reportagem jornalística indica como a desorganização lá dentro do hospital, que deixava na mão o porta-voz oficial Antônio Britto (Emílio Dantas), gerava um caos de boatos lá fora e que até hoje acompanham a morte de Tancredo em diversas teorias da conspiração – veja depois as principais na matéria da revista Mundo Estranho. Enquanto isso, em sua filmagem, o cineasta opta pela câmera na mão e uma sucessão de zooms, in ou out, às vezes dessincronizados com o que acontece em cena ou excessivos, além dos cortes da montagem, para conferir a urgência da situação e uma estética mais cinematográfica a uma produção com jeito e impactos que parecem de um telefilme ou especial televisivo.

O esteio se encontra em um elenco coeso, em que nem Othon Bastos, em sua consistência e emoção, protagoniza, mas tem seus momentos de destaque, assim como os coadjuvantes. Leonardo Medeiros e Paulo Betti se sobressaem entre a equipe médica, especialmente quando se evidencia o embate entre eles, mas em quem terceiro ato morno, é a vez de Esther Góes ganhar a cena na pele de Risoleta Neves, a esposa de Tancredo. Uma pena que o roteiro prefira telegrafar através de alguns diálogos expositivos as reações da personagem, que já seriam suficientes na interpretação da atriz.

Se o mesmo ocorre com o texto para deixar marcado a necessidade que todos sentiam de sua posse para o bem da nação e o próprio medo do presidente eleito de, por sua causa, fracassar a redemocratização do país por qual tanto lutou, seja por receio dos militares extremistas insatisfeitos com o processo ou pela insustentabilidade do seu vice José Sarney, pode se relevar o didatismo imposto para explicar a um público leigo uma passagem tão crucial para a história do Brasil. Ao som de Milton Nascimento e sua canção Coração de Estudante, uma das músicas que marcou o movimento pelas Diretas Já, Rezende encerra o filme mitificando exageradamente a figura de Tancredo, mas acerta ao colocar a sua morte como o fim de uma esperança para o povo brasileiro, que, depois de ver a sua luta por eleições diretas se transformar em uma votação no Congresso, assistia à agonia desse sonho através do que Neves passada em seus últimos dias. Daí, o temor virou realidade e, com Sarney assumindo o mandato, veio a hiperinflação; uma nova espera com o primeiro presidente eleito democraticamente, Fernando Collor de Mello, seguida pela desesperança do impeachment; e assim, um sucessão de expectativas e realidades as colocando por terra que caracterizam a política nacional desde então.

Pode-se ressentir que O Paciente – O Caso Tancredo Neves (2018) não aprofunde estas questões e trace paralelos com a atualidade, mas se o espectador é capaz de encontrar neste “drama de erros médicos” uma alegoria da comédia encenada diariamente em Brasília e replicada em todo o país.

 

O Paciente – O Caso Tancredo Neves (2018)

Duração: 100 min | Classificação: 10 anos

Direção: Sérgio Rezende

Roteiro: Gustavo Lipsztein, baseado no livro “O Paciente – O Caso Tancredo Neves” de Luís Mir

Elenco: Othon Bastos, Esther Góes, Leonardo Medeiros, Otávio Müller, Paulo Betti, Emílio Dantas, Mário Hermeto, Lucas Drummond, Luciana Braga, Priscila Steinman, Elcir de Souza, Leonardo Franco e Emiliano Queiroz (veja + no IMDb)

Distribuição: Downtown Filmes / Paris Filmes

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