Nayara Reynaud
É TUDO VERDADE 2018 | Tributos cinematográficos entre amigos
Atualizado: 15 de ago. de 2020
O segundo dia da 23ª edição do festival É Tudo Verdade resgata a memória cinematográfica com o retrato de dois cineastas latino-americanos. Em Amarra Seu Arado a Uma Estrela (2017), Carmem Guarini adentra a intimidade do amigo e um dos principais nomes do cinema argentino, Fernando Birri, durante as filmagens de seu documentário utópico, vinte anos atrás. Já Mario Abbade faz reverência à figura controversa e subversiva de Neville D’Almeida – Cronista da Beleza e do Caos (2018), presente na Competição de Longas e Médias Brasileiros.
Mais que a recuperação de uma memória, quase fisicamente perdida pelas intemperes que uma fita VHS pode sofrer em 20 anos, Amarra Seu Arado a Uma Estrela procura reavivar sonhos, especialmente os utópicos. A palavra utopia permeia todo o exercício metalinguístico da argentina Carmem Guarini no seu retrato íntimo do amigo, compatriota e nome precursor do chamado Novo Cinema Latino-Americano, Fernando Birri (1925-2017). A documentarista, que já esteve na edição de 2002 do É Tudo Verdade, com H.I.J.O.S.: El Alma en Dos (2002), retorna ao material gravado em 1997, quando acompanhava o diretor argentino de volta ao país para rodar seu próprio filme.
No caso, o cineasta cruzava a Argentina para versar sobre os 30 anos da morte de Ernesto “Che” Guevara – também abordada no outro concorrente da competição latino-americana Che, Memórias de Um Ano Secreto (2018), de Margarita Hernandez–, perguntando para as pessoas, entre transeuntes no caminho e entrevistados, o significado de utopia para elas. O resultado foi visto em Che: Muerte de la Utopia? (1999), terceiro trabalho documental de Birre sobre o líder revolucionário latino – antes, fez Che, Buenos Aires (1962) e Mi Hijo el Che – Un Retrato de Familia de Don Ernesto Guevara (1985) – que, assim como a produção de Guarini ao revelar seus bastidores, mostra como o artista que se exilou ciganamente em vários países, começando pelo Brasil, com o início da ditadura argentina, não abandonou sua posição política e pretendia desvendar como ela ainda seria útil naquele mundo em transformação de vinte anos atrás.
Ao reencontrar o artista, que imprimiu suas críticas sociais já no curta-metragem Tire Dié (1960) e na comédia Los Inundados (1961) e sedimentou seu legado criando um instituto de cinema em Santa Fé, sua cidade natal, e fundando a famosa Escola Internacional de Cinema e Televisão de San Antonio de los Baños, em Cuba, a amiga se depara com uma figura mais fragilizada a quem mostra fotos da antiga filmagem. Tanto que, um mês após a estreia de Amarra Seu Arado a Uma Estrela no Festival Internacional de Cinema de Mar del Plata, o cineasta veio a falecer, aos 92 anos. Da intimidade que Guarini obtém, o documentário faz sua principal homenagem à Birri, ainda que não tenha o mesmo vigor do retratado em lidar com as questões políticas que levanta em seus 80 minutos, que parecem mais extensos ao final.
Amarra Seu Arado a Uma Estrela (Ata Tu Arado a una Estrela, 2017)
Duração: 80 min | Classificação: 14 anos
Direção: Carmen Guarini
Produção: Argentina / Buenos Aires
Áudio e Legendas: diálogos em espanhol, com legendas em inglês e legendas eletrônicas em português
> IMS Paulista / São Paulo – 13/04/2018 às 17h00
> Estação NET Botafogo / Rio de Janeiro – 16/04/2018 às 16h00
> Itaú Cultural / São Paulo – 18/04/2018 às 15h00
> Itaú Cultural / São Paulo – 19/04/2018 às 17h00
> IMS Rio / Rio de Janeiro – 19/04/2018 às 20h00
> Centro Cultural São Paulo – CCSP / São Paulo – 20/04/2018 às 19h00
Levando o mesmo nome de uma mostra itinerante que organizou sobre a obra do cineasta, o crítico de cinema carioca Mario Abbade apresenta seu Neville D’Almeida – Cronista da Beleza e do Caos em tom de reverência e admiração. Diretor de clássicos cheios de erotismo cercados de polêmicas, como A Dama do Lotação (1978), Os Sete Gatinhos (1980) e Rio Babilônia (1982), o documentarista estreante tenta levar à luz de novos cinéfilos esta figura controversa e muitas vezes relegada no cenário histórico do cinema nacional. O longa exibido no último Festival de Roterdã, porém, não apresenta a mesma inventividade e ousadia do retratado ao seguir a fórmula de entrevistas talking heads do próprio Neville, seus parceiros de equipe, amigos e críticos, entremeados por trechos de seus filmes.
Os depoimentos costuram uma narrativa que apresenta o diretor mineiro, radicado no Rio de Janeiro, como o cineasta mais censurado pela ditadura e alvo de um preconceito velado que ainda o persegue, enquanto aborda outras questões: sua relação com Nelson Rodrigues, autor de quem adaptou dois de seus trabalhos; também com o Cinema Marginal que se opunha ao Cinema Novo, apesar de reitar o título do movimento; os trabalhos como artista plástico na longa amizade com Hélio Oiticica; e os supostos 20 anos sem filmar. Em uma discussão inicialmente masculina se o excesso de nudez e exposição feminina na obra do cineasta faria dele um sexista ou um defensor da liberdade sexual das mulheres, somente depois de um tempo, algumas atrizes dão sua opinião, mas a produção claramente toma partido para um lado. O próprio Neville toma a recusa de Sônia Braga, a sua Dama do Lotação, em falar no documentário, a seu favor, sem antes saciar mais uma vez o seu ego.
Duração: 106 min | Classificação: 18 anos
Direção: Mario Abbade
Produção: Brasil / Rio de Janeiro-RJ
Áudio e Legendas: diálogos em português, com legendas em inglês
> Estação NET Botafogo / Rio de Janeiro – 13/04/2018 às 20h30
> IMS Paulista / São Paulo – 17/04/2018 às 19h00
> IMS Paulista / São Paulo – 17/04/2018 às 21h15
> IMS Rio / Rio de Janeiro – 18/04/2018 às 16h00
> Sesc 24 de Maio / São Paulo – 20/04/2018 às 15h00
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