top of page
  • Foto do escritorCauê Petito

MOSTRA SP 2017 | Dia 6 – Batinas em crise

Atualizado: 1 de mai. de 2021

No dia em que o clássico de Joaquim Pedro de Andrade, O Padre e a Moça (1966), será exibido gratuitamente no Vão Livre do MASP, com a presença dos atores Paulo José e Helena Ignez na apresentação especial, a 41ª Mostra traz outro clérigo em crise se equilibrando entre a sua fé e o mundo corruptível que o cerca, no italiano Equilíbrio (2017). Esta terça também tem Scary Mother (2017), primeiro longa de Ana Urushadze, candidato da Geórgia para a corrida do próximo Oscar.

 

Mimmo Borrelli em cena do filme italiano Equilíbrio (2017), de Vincenzo Marra | Foto: Divulgação (Mostra SP)

"Equilíbrio: condição de um sistema em que as forças que sobre ele atuam se compensam, anulando-se mutuamente". Não poderia haver nome melhor para a triste obra do italiano Vincenzo Marra, sobre Giuseppe (Mimmo Borrelli), um padre em crise de fé que decide voltar para sua região natal. Substituindo o eloquente e carismático padre Don Antônio (Roberto del Gaudio) numa vila dominada pelo crime e corrupção, o determinado padre tenta, a todo custo, ajudar aquelas pessoas, apenas para aprender que isso será mais difícil e complexo do que ele imagina.

Como diz o próprio Don Antônio, o equilíbrio deve ser mantido. Dessa forma, Giuseppe acaba percebendo, lentamente, que a igreja convive junto com esse crime organizado, não interferindo em seus assuntos, mesmo que eles prejudiquem a maior parte de sua população. O que Antônio deseja é que Giuseppe não interfira, e dê apoio para aquelas pessoas da forma mais conhecida: pedindo sempre para que tenham fé e rezem seus terços.

Ao final de Equilíbrio, a dúvida se instala. Seria mesmo possível salvar aquelas pessoas? Giuseppe tenta a todo custo propagar a bondade, não só a divina (mostrando-se um indivíduo entusiasmado, que, porém, não empurra sua palavra), mas a bondade pura de fazer bem ao próximo, de ajudá-los e sacrificar a si mesmo para que todos eles tenham uma vida melhor. Infelizmente, o mundo atual não é tão simples, e vemos o personagem ser testado física e psicologicamente, culminando no plano em que Giuseppe, em um nu frontal, toma banho num desespero e necessidade de purificação que parece nunca vir.

Adotando uma estética documental desde seu primeiro plano, na qual Giuseppe caminha em direção à câmera inquieta, enquanto pode-se ouvir as vozes distorcidas das pessoas nos outros aposentos – algo característico dessas filmagens documentais, Equilíbrio frequentemente segue seus personagens em longos planos, como se estivesse a todo momento querendo relatar algo real.

Com boas atuações, o italiano Equilíbrio é uma obra triste que nos faz questionar, através de seu protagonista, nossa própria moralidade. O padre Giuseppe é confrontado, em determinado momento, sobre sua ação, que pode prejudicar a todos naquela vila, mas salvaria a vida de uma garota. "É a vida de uma garotinha", diz o padre, que só quer, a todo custo, fazer a bondade.

Bondade que vem não pelo caminho divino, mas humano. Infelizmente, na triste realidade vista aqui, há a necessidade pelo equilíbrio.


CINEARTE 2

24/10/17 - 16:10 - Sessão: 451 (Terça)

ESPAÇO ITAÚ DE CINEMA - AUGUSTA ANEXO 4

29/10/17 - 19:30 - Sessão: 1056 (Domingo)

ESPAÇO ITAÚ DE CINEMA - FREI CANECA 4

30/10/17 - 13:30 - Sessão: 1162 (Segunda)

 

Scary Mother

Uma mulher de meia idade acorda num quarto escuro. Com um rosto pálido – vampírico até – e uma expressão de desgaste emocional e físico que apenas aqueles que já estiveram em seu lugar podem compreender. Ela demonstra incômodo pelo faixo de luz que cruza sua face. Em sua mão, inúmeras anotações que sobem por seu braço.

Esta é a reclusão na qual Manana (Nato Murvanidze), protagonista de Scary Mother, se submete para que consiga terminar de escrever seu livro. Mais do que auto-imposto, tal isolamento soa quase que obrigatório; mais um resultado de anos de imposições e deveres estabelecidos por seu papel em uma sociedade ainda patriarcal do que um mero isolamento para a inspiração, ainda que a mesma use o último caso como justificativa. A família da protagonista, composta por seu marido, respeita o espaço da mãe, que possui também o apoio de seu amigo, o balconista de uma loja de livros que insiste em afirmar que Manana possui uma obra-prima em mãos. Conforme o obsceno conteúdo do livro é revelado,numa cena que começa num zoom out e é, literalmente, de tirar o fôlego, mais abrem-se portas para o subconsciente imprevisível e assombroso de Manana, ao passo que sua família desmorona diante daquelas páginas.

Scary Mother poderia seguir o caminho do drama sobre a mulher que se liberta das algemas conservadoras e machistas e triunfa sobre tais adversidades, abrindo um lado sensível de si para o mundo, que a reconhece como a mente brilhante que seu amigo tanto clama. Ainda que, por um bom tempo de seus 107 minutos, ele seja exatamente isso, o primeiro filme da jovem cineasta Ana Urushadze e representante da Geórgia para o Oscar abraça gradualmente o thriller psicológico, culminando no puro terror que atinge seu ápice não com sustos ou sangue, mas com um diálogo e o que aquelas horríveis e íntimas palavras possam representar.

Nesse sentido, Scary Mother é quase que uma resposta ao filme que divide metade de seu nome, o polêmico Mãe! (Mother!), de Darren Aronofsky: a mãe que tem sua essência corrompida por aqueles ao seu redor, enquanto tenta a todo custo ficar em paz e alcançá-la através de sua expressão artística. Simbolismos religiosos à parte, enquanto aquela produção provoca o terror e desconforto através – em sua maior parte – do choque, do grandiloquente e do dramático, este opta por uma abordagem de igual angústia e inquietude através da atmosfera. Seja no design de som que ressalta ruídos quase diegéticos ou na forma com que utiliza a luz para transformar seus personagens em figuras assustadoras, o longa georgiano nos permite entrar lentamente na cabeça de sua protagonista, que é refletida nas próprias paredes do prédio em que Manana vive – deterioradas.

Até que chegamos ao aterrador final de Scary Mother, magistral estreia na direção de Ana Urushadze, onde o pavor nos encontra não através da história contida no livro de Manana em si, mas da sensação de termos presenciado algo íntimo, visceral, algo tão pessoal que acaba transcendendo essa ideia do subconsciente, da ficção, e se torna real.

ESPAÇO ITAÚ DE CINEMA - AUGUSTA SALA 1

24/10/17 - 17:00 - Sessão: 476 (Terça)

ESPAÇO ITAÚ DE CINEMA - FREI CANECA 1

27/10/17 - 19:00 - Sessão: 829 (Sexta)

ESPAÇO ITAÚ DE CINEMA - FREI CANECA 6

29/10/17 - 17:10 - Sessão: 1085 (Domingo)

0 comentário

Posts Relacionados

Ver tudo
bottom of page