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  • Foto do escritorNayara Reynaud

MINHA VIDA DE ABOBRINHA | Uma família ao (des)acaso

Atualizado: 26 de abr. de 2020


Cena da animação franco-suíça Minha Vida de Abobrinha (2016) | Foto: Divulgação (Califórnia Filmes)


A princípio, pode parecer estranho que Icare faça questão de ser chamado por um apelido pronto para o bullying alheio, ainda mais em um ambiente aparentemente hostil como de um abrigo para menores. Mas, para o menino de nove anos, isso é o de menos se ser o “Abobrinha” é uma das poucas maneiras que encontra para manter o laço com a sua mãe recém-falecida.

A única lembrança material que tem dela é uma das muitas latas de cerveja que ela bebia. A afetiva é de uma vida condenada à miséria humana pelo alcoolismo, mas capaz de momentos ternos como chamar o filho pelo nome do vegetal. Quase um paradoxo que marca a animação franco-suíça Minha Vida de Abobrinha (2016), um tanto melancólica quanto cativante.

A produção em stop motion dirigida por Claude Barras acompanha o drama do órfão que, enquanto se culpa pela morte acidental da mãe alcóolatra – amenizada no longa em relação ao livro em que se inspira, Autobiographie D'Une Courgette, do jornalista Gilles Paris, em que uma arma faz parte da cena –, ainda precisa se acostumar à nova rotina no abrigo, onde Simon, o garoto ruivo que age como líder do pedaço, zomba dele diariamente. Porém, logo a hostilidade se transforma em amizade naquele grupo que, por diferentes razões, se encontra ali na mesma situação.

Aliás, o filme, indicado à Melhor Animação no Oscar 2017, além de figurar a pré-lista na categoria de estrangeiros pela Suíça, acerta ao mostrar que muitos dos menores abrigados não são necessariamente órfãos. E o roteiro de Céline Sciamma confere uma gama dos principais casos e consequências de ameaça à infância que levam a esse extremo, através dos pequeninos personagens. O próprio Simon foi afastado dos pais drogados; os outros meninos, do pai que está preso e da loucura materna; uma garota espera a volta da mãe deportada, enquanto outra foi vítima de pedofilia e apresenta um comportamento, talvez, autista ou obsessivo-compulsivo; e a novata, que encanta Abobrinha, tem uma tia que só deseja ficar com ela por causa da pensão do governo.

Trata-se de uma perspectiva pouco vista no cinema e que, nas vezes em que foi explorada, rendeu excelentes filmes que revelam estas crianças à margem da sociedade. Seja exemplo este longa, que trabalha bem a questão do preconceito em uma cena durante a excursão nos Alpes, ou do indie norte-americano Temporário 12 (Short Term 12), que despontou em 2013, com Brie Larson em ótima atuação e mostrando também as dificuldades dos funcionários em lidar com esses menores e seus traumas. Algo mostrado aqui mais na figura do policial que descobre esse novo mundo.

Mas a escolha do stop motion artesenal, até longe do visual digital característico do estúdio Laika, por exemplo, confere à obra uma ternura que se equilibra com o retrato da realidade. Por isso, apesar dos temas sérios, Minha Vida de Abobrinha é capaz de dialogar com o público infantil, que certamente entenderá que outras crianças, infelizmente, são jogadas no mundo adulto das mais erradas formas.

 

Minha Vida de Abobrinha (Ma Vie de Courgette, 2016)

Duração: 66 min | Classificação: 10 anos

Direção: Claude Barras

Roteiro: Céline Sciamma com colaboração de Germano Zullo, Claude Barras e Morgan Navarro, baseado no livro “Autobiographie D'Une Courgette” de Gilles Paris

Elenco: vozes de Gaspard Schlatter, Sixtine Murat, Paulin Jaccoud, Michel Vuillermoz, Raul Ribera, Estelle Hennard, Elliot Sanchez, Lou Wick, Brigitte Rosset e Natacha Koutchoumov (veja + no IMDb)

Distribuição: Califórnia Filmes

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