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  • Foto do escritorNayara Reynaud

MOSTRA SP 2018 | Dia 1 – Entre a pureza e o mal humanos

Atualizado: 15 de fev. de 2021


Mostra SP 2018 - Dia 1: Infiltrado na Klan | Culpa | A Odisseia de Peter | El Creador de Universos | Fotos: Divulgação (Mostra Internacional de Cinema em São Paulo)

O primeiro dia da 42ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo pretende já trazer grandes filmes para o público cativo do evento e aqueles que estão descobrindo esse carnaval cinéfilo paulistano. Tem o premiado em Cannes, Infiltrado na Klan (2018) uma espécie de "Doing the wrong thing again" de Spike Lee, e o candidato dinamarquês para o Oscar, Culpa (2018), que tem tudo para ser um filme sensação entre os mosteiros tal qual foi agraciado pelo público em Sundance e Roterdã. Num contraponto, o imaginário infanto-juvenil aparece na ficção russa A Odisseia de Peter (2017) e no documentário uruguaio El Creador de Universos (2017).

 

(BlacKkKlansman, 2018)

Adam Driver e John David Washington em Infiltrado na Klan (2018) | Foto: Divulgação (Mostra Internacional de Cinema em São Paulo)

Em seu novo filme, o cineasta Spike Lee versa sobre o papel do cinema na manutenção ou enfrentamento de uma desigualdade racial tão evidente agora quanto nos anos 1970 em que se passa a história real em que se inspirou. Baseado no livro autobiográfico e homônimo do próprio investigador Ron Stallworth, Infiltrado na Klan (2018) resgata o caso deste que foi o primeiro policial negro da polícia de Colorado Springs e que, com a ajuda de um companheiro de departamento, adentra e se torna membro da Ku Klux Klan, organização norte-americana que prega a supremacia branca, para ter conhecimento de suas ações. Citando o importante em linguagem e técnica, porém, controverso para dizer o mínimo em seus preconceitos, O Nascimento de uma Nação (1915), e contrapondo com os títulos e até utilizando o estilo da Blaxploitation, especialmente na sequência final, o diretor traça um panorama com duras críticas ao racismo nos Estados Unidos, fatores que levaram a produção a receber o Grande Prêmio do Júri no Festival de Cannes deste ano.

Sua direção já começa a imprimir uma marca quando John David Washington – sim, ele é filho de Denzel – na pele do protagonista, já aprendendo a arte de se infiltrar, tem contato com os discursos de um ex-Pantera Negra (Corey Hawkins) e a jovem ativista Patrice (Laura Harrier) em um encontro de jovens universitários afro-americanos, cujos rostos de descoberta de sua própria beleza, força e resistência são destacados sob um fundo preto. Mas a assinatura de Lee, deixada lá em seu filme-chave Faça a Coisa Certa / Do the Right Thing (1989), com os planos holandeses, aqueles tortos em diagonal, surgem a partir do segundo ato, quando a situação fica mais tensa e crítica na investigação dele e do judeu Flip Zimmerman (Adam Driver), que encarna o “Ron Stallworth branco”, criado pelo original em ligações ao chefe regional da Ku Klux Klan (Ryan Eggold) e inclusive ao grão-mestre da KKK David Duke (Topher Grace). Tal qual sua obra-prima, utiliza o tom cômico para falar de racismo, seguindo o caminho da ridicularização – sem a redenção presente em Três Anúncios Para um Crime (2017), por exemplo – em vez de uma vilanização melodramática dos membros da organização; uma opção que quebra barreiras para atingir o seu objetivo, mas que em tempos de falta de interpretação e exercício de escuta ao diálogo, gere certa rejeição e falta de identificação do espectador que compartilha das mesmas ideias dos inimigos da tela.

O roteiro escrito pelo cineasta ao lado de Charlie Wachtel, David Rabinowitz e Kevin Willmott é inteligente nas menções (in)diretas a Donald Trump, como o uso do slogan “America First” e a fala sobre um plano de colocar alguém da organização na Casa Branca, mas recaí em alguns momentos, junto com a direção, em um didatismo que retira certo impacto desse equilíbrio de denúncia satírica da narrativa, a exemplo da montagem que precisa “desenhar” para o espectador o discurso já claro do longa ao intercalar a cerimônia do grupo supremacista branco e o relato de um senhor sobre racismo na reunião dos estudantes negros. A mão pesada naquele trecho era desnecessária já que Lee endereça o seu recado de maneira mais pungente ao final, jogando na cara da plateia – que na sessão para a imprensa (novidade, só que não!), era quase em sua totalidade branca – a realidade contemporânea com as imagens das manifestações dos supremacistas e ataque aos que se opunham a ela na cidade de Charlottesville, na Virgínia, em agosto do ano passado, mostrando o David Duke da vida real e as falas condescendentes de Trump a eles. O paralelo com o cenário brasileiro atual é inevitável, ainda mais agora com a própria KKK opinando até sobre um dos nossos candidatos à presidência.

> CineSesc – 18/10/2018 às 21h15

> Espaço Itaú Frei Caneca 1 – 19/10/2018 às 19h10

> Espaço Itaú Pompeia 1 – 22/10/2018 às 21h00

> Cinesala – 26/10/2018 às 18h40

> Espaço Itaú Augusta 1 – 29/10/2018 às 14h00

 

(Den Skyldige, 2018)

Jakob Cedergren no filme dinamarquês Culpa (2018) | Foto: Divulgação (Mostra Internacional de Cinema em São Paulo)

Escolhido como representante da Dinamarca na corrida do Oscar de Filme Estrangeiro do ano que vem, Culpa (2018) é aquele filme que vai arrebatar a plateia e, provavelmente, crescer no boca-a-boca entre os mostreiros, assim como Custódia (2017) fez na edição passada. Em seu primeiro longa-metragem, o dinamarquês Gustav Möller provoca sensações e navega até por temáticas que recordam o filme do francês Xavier Legrand, por exercer a mesma capacidade narrativa de manter o espectador tenso e em suspense do início ao fim. Não à toa, a produção venceu prêmio da audiência dos festivais de Sundance e Roterdã.

Mesclando esse controle e efeito narrativo a uma trama que também lembra o thriller Por um Fio (2002), sem aquelas interferências externas, troca-se a cabine telefônica onde Colin Farrell ficava direto naquela história pela central de emergência de Copenhague, acompanhando o turno, que se torna até extra, do policial Asger Holm (Jakob Cedergren, excelente e preciso nas nuances deste personagem) lá, onde o longa se passa inteiramente durante os seus 90 minutos. A escalada de tensão começa com a ligação de uma mulher pedindo socorro disfarçadamente por estar em mãos de um homem. Mais alguns telefonemas, inclusive para a pequena filha dela, e o atendente descobre logo quem é este homem. Só que isso não é um alívio, apenas mais uma crescente no filme, cujas viradas vem num rígido e paciente desvelar da trama, embora o jovem e talentoso diretor use a luz vermelha, tal qual Joe Wright no recente O Destino de uma Nação (2017), em um momento de urgência raivosa, ainda antes do clímax arrebatador.

No entanto, se no sucesso de Joel Schumacher o perigo estava à espreita do protagonista lá fora da cabine, no filme dinamarquês, ele se encontra mais dentro da psique de Asger. O espectador sabe brevemente que aquele turno acontece na véspera de um julgamento sobre algum incidente que jogou este policial para esse serviço interno, mas somente o compreende aos poucos. Mantendo uma tradição do cinema escandinavo de abordar questionamentos morais de maneira tão eficiente, Möller ainda trata de imigração e preconceito nas entrelinhas e de maneira mais direta a questão da saúde mental, mas tem no exercício da culpa e sua predileção em se acumular o norte desta obra.

> Espaço Itaú Pompeia 1 – 18/10/2018 às 21h00

> Cine Caixa Belas Artes – Sala 1 Villa Lobos – 19/10/2018 às 17h20

> PlayArte Marabá – Sala 1 – 20/10/2018 às 15h00

> Espaço Itaú Frei Caneca 1 – 21/10/2018 às 21h50

> Cinearte Petrobras 1 – 29/10/2018 às 17h30

 

(Odysseya Petra, 2018)

Dmitriy Gabrielyan no filme russo A Odisseia de Peter (2018)  | Foto: Divulgação (Mostra Internacional de Cinema em São Paulo)

Estreia na direção de longas da dupla Anna Kolchina e Alexey Kuzmin-Tarasov, A Odisseia de Peter (2018) é aquele tipo de filme que explora o imaginário infanto-juvenil, mas que tem uma visão adulta sobre a imaginação dos jovens. O Petya (Dmitriy Gabrielyan) em questão, que é o Peter do título traduzido, é um menino russo de 12 anos vai morar com os pais na Alemanha e tem dificuldades de se integrar à nova realidade, sofrendo também com o bullying dos novos colegas, se refugiando nas recordações muito saudosas da avó com quem mais convivia em um cenário interiorano nos arredores de Moscou. Assim, as sequências na Rússia fluem com a steady cam e uma aura de sonho e lembrança no branco esfumaçado da fotografia, enquanto a ambientação na Alemanha traz uma câmera na mão nervosa, inquieta como o menino naquele novo lugar em que ele não se adapta.

A referência à Odisseia de Homero narrando a volta para casa de Ulisses é direta nesta odisseia russa, mas o filme se ressente justamente por esse trecho mais aguardado e promissor vir apenas no terceiro ato, quando a narrativa já tinha perdido sua potência. Por fim, a trilha sonora traz coisas interessantes como uma espécie de Beck ou Moby russo.

> Espaço Itaú Frei Caneca 1 – 18/10/2018 às 15h30

> Circuito Spcine Olido – 19/10/2018 às 15h00

> MIS – Museu da Imagem e do Som – 20/10/2018 às 17h00

> Cinearte Petrobras 2 – 23/10/2018 às 19h30

> Espaço Itaú Frei Caneca 4 – 30/10/2018 às 20h30

 

(El Creador de Universos, 2017)

Cena do documentário uruguaio El Creador de Universos (2017) | Foto: Divulgação (Mostra Internacional de Cinema em São Paulo)

Primeiro filme que a uruguaia Mercedes Dominioni realiza, El Criador de Universos (2017) é um documentário familiar na tela e por trás dela, embora não fique certo qual o grau de parentesco da jovem cineasta que tem o mesmo sobrenome dos personagens em destaque. São eles o jovem Juan, de 16 anos e com Síndrome de Asperger – embora este diagnóstico esteja na sinopse e não declarado no longa – e sua vó Rosa, de 96 anos, com quem grava os filmes e telenovelas que cria. Esses universos que o adolescente com medo de virar adulto imagina, dirige e dá vida têm tramas folhetinescas, com as vinganças e vilanias que ele assiste na TV, e apesar de todo amadorismo, carrega algumas noções básicas de narrativa e, no subconsciente, a relação que extrema necessidade é, às vezes, repulsa, que estabelece com a avó.

Além dessa metalinguagem do dispositivo do documentário em acompanhar prioritariamente essas filmagens, a produção retrata o cotidiano de alguém com Asperger e a velhice. Em sua maneira meio obsessiva, típica do espectro autista do qual a síndrome faz parte, Juan não enxerga o cansaço da avó. Sabiamente, em certo ponto do longa, Mercedes muda o foco de sua atenção, literal e figurativamente, com o protagonismo saindo do jovem para ir à Rosa, cujo talento e carisma é evidente já na pequena câmera do neto, mas apenas a lente da diretora transparece o peso da morte que aquela senhora está sentindo cair sobre ela.

> Circuito Spcine Olido – 18/10/2018 às 19h00

> Circuito Spcine CCSP – Paulo Emílio – 21/10/2018 às 15h00

> Cinusp ECA – 24/10/2018 às 19h00

> PlayArte Marabá – Sala 4 – 28/10/2018 às 13h00

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