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  • Foto do escritorNayara Reynaud

FIM 2018 | A pureza da resposta das crianças

Atualizado: 18 de out. de 2020


Jacinta Chávez de León e Andrea Sutton-Chávez em cena do filme mexicano Tesoros (2017) | Foto: Divulgação (FIM 2018)

O retrato de mães em crise, que logo em seu primeiro longa-metragem, Lola (1989), foi premiado em Berlim e, com Sem Deixar Pistas (2000), agraciado em Sundance, marcou a filmografia de María Novaro. Ao longo de seus mais de 30 anos de carreira, ela se notabilizou como o principal nome da primeira geração de diretoras a despontar dos bancos da universidade para as telas do cinema mexicano. Hoje, já uma avó coruja, a cineasta literalmente abaixa o foco da sua lente do mundo adulto para o infantil, colocando seus próprios netos ao lado de outras crianças como as estrelas de Tesoros (2017), seu trabalho mais recente, exibido na Mostra Generation do Festival de Berlim do ano passado.

Usando os próprios nomes, Dylan Sutton-Chávez e Andrea Sutton-Chávez são, respectivamente, o menino curioso e impaciente para chegar e a pré-adolescente resistente à mudança do trio de irmãos, viajando em uma van na abertura do filme. A família deles, que antes só passava as férias na região, agora vai morar de fato em Barra de Potosi, no litoral mexicano banhado pelo Oceano Pacífico, como informa a narração de Jaci, filha de um casal de biólogos locais vivida por Jacinta Chávez de León, outra neta de Novaro. A menina e a realizadora, então, continuam a apresentar, um a um, os pequenos que vivem no lugarejo durante todo o primeiro ato, enquanto os recém-chegados tentam se acostumar a essa rotina à beira-mar. Até que Dylan sonha com o pirata inglês – mesma nacionalidade de seu pai – Francis Drake, cuja figura está no jogo bucaneiro do seu tablet, dizendo-lhe sobre o seu tesouro escondido, o qual o garoto se lança a procurar com a ajuda dos seus novos amigos.

O registro, assim como o uso da própria comunidade na produção, confere a ela tons documentais, mas a narrativa nunca deixa de ser ficcional, apesar da naturalidade que Novaro obtém do elenco mirim. Com a câmera na altura das crianças, mesmo do caçula Lucas (Lucas Barroso Tillinger), os adultos que surgem no quadro estão sempre sujeitos ao ponto de vista de seus filhos, sobrinhos ou alunos. O azul do mar na paleta de cores ou os raios de Sol que invadem a fotografia de Gerardo Barroso e Lisa Tillinger tornam o longa vibrante, ainda que Tesoros tenha um ritmo de maresia.

Em compasso diferente da maioria dos filmes infantis, o longa de María não busca o estímulo frenético desses tempos hiperativos, mas a cadência natural das brincadeiras “pé no chão” ou na água das crianças que vivem neste vilarejo litorâneo. Não que haja uma demonização da presença ostensiva da tecnologia sobre a geração atual. Ao contrário, aqui ela aparece para auxiliar e não suplantar a imaginação delas na busca inocente pelo “X” do mapa que as levará para o tesouro do pirata – o ladrão que rouba dos colonizadores que assaltaram o continente de várias maneiras, inclusive em sua inocência, segundo a lembrança do passado colonial que o longa vislumbra.

O título, aliás, que remete não só à riqueza material, mas também à forma com a qual muitos pais tratam carinhosamente seus filhos na língua espanhola, ressalta este imaginário infantil como o verdadeiro tesouro, tal qual às riquezas naturais de Potosi, seja as do meio ambiente ou as humanas, originadas por uma comunidade que se une apesar das diferenças evidentes, cuja preservação é defendida pela obra. Retratada como um paraíso em Guerrero, um dos estados mais violentos do México, os créditos finais dedicam o filme aos 43 estudantes que se tornariam professores de escolas rurais como a que serve de cenário aqui, se não desaparecessem após o Massacre de Iguala em 2014, até hoje não esclarecido pelo governo mexicano. Daí se entende mais a declaração da cineasta ao afirmar que Tesoros é uma resposta contra a violência: em vez de se apegar em uma mazela muito conhecida de seu país – e que, salvo suas particularidades, os brasileiros conhecem bem –, Novaro preferiu ficar “com a pureza da resposta das crianças” como alternativa de um novo caminho.

 

Tesoros (Tesoros, 2017)

Duração: 96 min

Direção: María Novaro

Roteiro: María Novaro

Elenco: Dylan Sutton-Chávez, Andrea Sutton-Chávez, Michel Lucas, Julieta Bárcenas, Ángel David Pérez, Matilde Hernández, Jimena Mar Nava, Avimael Cadena, Kevin García, Judith De León, Martin Sutton, Jacinta Chávez de León, Aranza Bañuelos, Julio Suástegui, Alondra Gómez, Fabiana Hernández, Jazmín Bárcenas, Howin Albarrán, Zindu Cano, Santiago Chávez, Mara Chávez e Lucas Barroso Tillinger

Distribuição: Figa Films

> Espaço Itaú Augusta – 09/07/2018 às 16h00

> CineSesc – 10/07/2018 às 21h30

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