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Foto do escritorNayara Reynaud

É TUDO VERDADE 2018 | Entre registros familiares, música e mazelas sociais

Atualizado: 18 de dez. de 2020

Entre homenagens a figuras das artes e familiares, vários cantos, e abordagens variadas de problemas sociais, a 23ª edição do festival É Tudo Verdade trouxe nove títulos para a sua competição de curtas-metragens brasileiros, que foram divididos em dois blocos nas sessões na programação – mas que, aqui, em uma breve observação, serão todos misturados.

Cena utilizada no curta documentário Sem Título #4: Apesar dos Pesares, Na Chuva Há de Cantares (2018) | Foto: Divulgação (Festival É tudo Verdade)

Sem Título #4: Apesar dos Pesares, Na Chuva Há de Cantares (2018), de Carlos Adriano, faz uma ode ao cinema se baseando apenas em um grande trabalho de montagem a partir de uma ampla pesquisa de cenas da Sétima Arte que foram marcadas pela chuva, embaladas por diversas versões, além da clássica do próprio filme Cantando na Chuva (1952), de Singin' in the Rain e outras músicas dentro do tema. Com 27 minutos de duração, o curta traz uma simpática nostalgia inicial, mas acaba se perdendo em reiterações e repetições que o tornam maçante.

Tetê (2018), curta documentário sobre a cantora Tetê Espíndola  | Foto: Divulgação (Festival É tudo Verdade)

Seguindo nas homenagens, mas de maneira individual, o trabalho de conclusão de curso da recém-graduada Clara Lazarim, Tetê (2018), entra no imaginário da cantora Tetê Espíndola para apresentar sua trajetória ao público. Em uma narrativa construída com imagens de arquivo da artista em programas televisivos, especialmente em atrações da TV Cultura como o Fábrica do Som (1983-84), e filmagens atuais da própria produção na casa dela, em seu show e uma cena final especial, o curta mergulha nesse espírito da natureza que guiou a obra da “pantaneira” Espíndola, cujo uso das improvisações na voz e da craviola se apropria dos sons dos pássaros.

Luiz Roberto Galizia em registro do curta documentário Inconfissiões (2017) | Foto: Divulgação (Festival É tudo Verdade)

O trabalho sonoro também guia Inconfissões (2017), obra em que a diretora Ana Galizia utiliza de vários artifícios narrativos para ambientar o material de arquivo que encontrou de seu tio, o ator, pesquisador e diretor de teatro Luiz Roberto Galizia, falecido em 1985. O desenho de som, trilha sonora, montagem e narração das cartas dele para a família, entre outros documentos, em off constroem a história pessoal do artista, seus trabalhos no Brasil e sua vida ao ir estudar em Berkeley, enquanto retrata, nas entrelinhas, uma das muitas baixas deixadas pela epidemia da AIDS, já em seu início.


Cena do curta documentário A Casa de Catharina (2018) | Foto: Divulgação (Festival É tudo Verdade)

Um retrato familiar igualmente difuso e contundente no uso de seu material surge em A Casa de Catharina (2018), curta no qual o diretor Felipe Arrojo Poroger homenageia a avó. Colocando apenas o áudio em off de gravações que fez com a avó Catharina sobre imagens atuais da casa dela e filmagens caseiras antigas no local, o neto cineasta estabelece de maneira indireta e muito afetiva a memória da falecida matriarca da família.

Cena do documentário Nome de Batismo – Alice (2017) | Foto: Divulgação (Festival É tudo Verdade)

A pernambucana Tila Chitunda também parte em um resgate de suas origens familiares, especialmente da imagem de sua avó falecida, em uma viagem a Angola que é apresentada em Nome de Batismo – Alice (2017). Tendo o mesmo nome de batismo dela, a diretora conhece uma grande quantidade de tios e primos que acolhem a ela e a sua mãe, refugiada da Guerra Civil Angolana que veio para Olinda em meados dos anos 70, onde ganhou a caçula Alice, que ainda se sente estrangeira ali. Quando um acontecimento inesperado põe a vida da cineasta em risco durante a viagem, o filme consegue enfim encontrar o seu âmago, ainda que ao final, vislumbrando algumas discussões, como a escravidão existente dentro dos próprios reinos angolanos e a descoberta de que sua família possui essa “realeza” maculada.

Cena do curta documentário Arara: Um Filme Sobre um Filme Sobrevivente (2017) | Foto: Divulgação (Festival É tudo Verdade)

Falando em passado nebuloso, Arara: Um Filme Sobre um Filme Sobrevivente (2017), de Lipe Canêdo, desencava imagens, gravadas pelo antropólogo Jesco Von Puttkamer, da formatura da Guarda Rural Indígena, em Belo Horizonte, em 1970, pleno auge da Ditadura no país. Através delas e de depoimentos de dois especialistas e dois índios das tribos que foram cooptadas para essa militarização forçada e lesadas em seu patrimônio, o curta discute a questão indígena naquele período e na atualidade.

Maria Tugira Cardoso em cena do curta documentário Catadora de Gente (2018) | Foto: Divulgação (Festival É tudo Verdade)

A exploração e desigualdade social são igualmente discutidas em Catadora de Gente (2018), através do perfil que a diretora Mirela Kruel traça de Maria Tugira Cardoso, catadora de lixo há 30 anos que, através do conhecimento adquirido pelos livros encontrados no próprio lixão, instruiu os seus colegas e formou uma cooperativa em Uruguaiana, no interior do Rio Grande do Sul, para lutar pelos seus direitos. Se apoiando demais no depoimento da própria retratada, o filme se vale da ótima personagem que tem em mãos.

Cena do curta documentário Sobre Imagem e Semelhança (2017) | Foto: Divulgação (Festival É tudo Verdade)

Enquanto isso, uma vida simples invade, em preto e branco, a tela de Sobre Imagem e Semelhança (2017), curta de Felipe Tomazelli e Ricardo Martensen que acompanha o cotidiano em uma pequena vila no Vale do Ribeira, dedicada à produção de peças de barro. A obra traça interessantes alegorias religiosas a partir dessa peculiaridade local, em paralelos entre divino e humano, como imagem e semelhança, segundo a fé cristã ali presente, que também prega justamente que o ser humano veio do barro, a exemplo da sequência que coloca o forno onde o material é preparado e logo a criança recém-nascida.

Cena do curta documentário Mini Miss (2017) | Foto: Divulgação (Festival É tudo Verdade)

Uma observação também marca Mini Miss (2017), curta de Rachel Daisy Ellis que presencia os bastidores de um concurso infantil de miss. Acompanhando o comportamento, as reclamações, incômodos e deslumbramentos de cinco meninas participantes, entre 3 e 5 anos, é da caçula do grupo que o filme extrai seus principais momentos, seja no seu imaginário infantil, vendo o Lobo Mau em um tapete, enquanto os adultos tentam “adestrá-las” para os trâmites do evento, ou no seu grito final de revolta e libertação em um microcosmo no qual todas ali são pressionadas, desde as mães, a não serem crianças.

 

Curtas 1

Duração: 29 min | Classificação: Livre

Direção: Felipe Tomazelli e Ricardo Martensen

Produção: Brasil / São Paulo-SP

Tetê (2018)

Duração: 27 min | Classificação: 10 anos

Direção: Clara Lazarim

Produção: Brasil / São Paulo-SP

Mini Miss (2017)

Duração: 17 min | Classificação: Livre

Direção: Rachel Daisy Ellis

Produção: Brasil / Recife-PE

Duração: 25 min | Classificação: Livre

Direção: Tila Chitunda

Produção: Brasil / Olinda-PE

> Centro Cultural São Paulo – CCSP / São Paulo – 21/04/2018 às 19h00

 

Curtas 2

Duração: 18 min | Classificação: 10 anos

Direção: Mirela Kruel

Produção: Brasil / Porto Alegre-RS

Duração: 10 min | Classificação: Livre

Direção: Felipe Arrojo Poroger

Produção: Brasil / São Paulo-SP

Duração: 13 min | Classificação: 12 anos

Direção: Lipe Canêdo

Produção: Brasil / Belo Horizonte-MG

Duração: 22 min | Classificação: 18 anos

Direção: Ana Galizia

Produção: Brasil / Rio de Janeiro-RJ

Duração: 27 min | Classificação: Livre

Direção: Carlos Adriano

Produção: Brasil / São Paulo-SP

> IMS Rio / Rio de Janeiro – 21/04/2018 às 18h00

> Centro Cultural São Paulo – CCSP / São Paulo – 22/04/2018 às 19h00


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