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  • Foto do escritorNayara Reynaud

A LEI DA NOITE | O sonho americano de Ben Affleck

Atualizado: 1 de mai. de 2020


Ben Affleck em cena do filme A Lei da Noite (2016) | Foto: Divulgação (Warner Bros.)


A máfia de Boston volta mais uma vez às telas, ainda que a cidade não seja o cenário principal de A Lei da Noite (2016), novo filme de Ben Affleck, que já explorou outras dinâmicas características da capital de Massachusetts em seus dois primeiros trabalhos. A disputa de poder no local, tendo a polícia entre os gângsteres irlandeses e italianos, já foi tema de uma série de produções em Hollywood e, talvez por isso, o quarto longa dirigido pelo astro, que também o roteiriza e protagoniza, sinta esse desgaste e deixe a desejar quando tem a oportunidade de entregar algo novo.

O ator, que fez sua estreia na direção justamente com uma adaptação de um livro de Dennis Lehane, no suspense dramático Medo da Verdade (2007), volta ao autor, tendo como fonte Os Filhos da Noite, a segunda parte de uma trilogia sobre os Coughlin, uma família de origem irlandesa, cujo pai (Brendan Gleeson) é um eminente capitão da polícia de Boston, enquanto o filho caçula, o protagonista desta trama, entra para o crime organizado.

A princípio, Joe Coughlin (Affleck) era apenas um ladrão veterano, que se contentava com seus roubos e não queria se meter nos negócios dos mafiosos da cidade. Só que ele se envolve nesse mundo de um jeito torto, ao se apaixonar e manter um caso secreto com Emma Gould (Sienna Miller), a amante de Albert White (Robert Glenister), o poderoso gângster irlandês. Depois de algumas reviravoltas, a chance que ele encontra para enfrenta-lo é sendo o “gerente” da máfia italiana na Flórida, a pedido do chefão Maso Pescatore (Remo Girone).

A perseguição com carros de época é o principal chamariz desta primeira parte do filme, mas a narrativa começa a ganhar ritmo e despertar um pouco da atenção da plateia quando a ação é deslocada para a Miami da passagem dos anos 1920 para a década de 30, marcada pela Depressão. Joe começa a controlar o tráfico de rum existente lá durante a Lei Seca, junto com os Suarez, uma importante família cubana da região, da qual ele se envolve com Graciela (Zoe Saldana). Para isso, ele conta com a vista grossa do chefe da polícia local, Figgis (Chris Cooper), cuja filha tem o sonho de fazer a vida em Hollywood; só que Loretta (Elle Fanning) volta desiludida e humilhada, achando refúgio na religião, o que pode por os futuros negócios de Joe em cheque.

O longa traz um bom trabalho de produção da equipe técnica, da fotografia à direção de arte, mas passa pelos olhos do público sem lhe causar paixão, nem para o bem nem para o mal. Talvez porque o pior pecado de Affleck como cineasta aqui seja não criar o mínimo de vínculo ou interesse no espectador pelos personagens. Se, como ator, ele interpreta Joe com certa apatia – Leonardo DiCaprio faria o protagonista originalmente, mas acabou ficando apenas como produtor –, como roteirista, ele desperdiça o potencial tridimensional de algumas figuras da história ou o explora bem pontualmente.

O policial distinto que infringe a ética e a lei para proteger o filho criminoso; a mulher dividida entre o amor de um pequeno bandido e as regalias e o poder sanguinário de um grande mafioso; e as marcas do pecado e a esperança duvidosa pela salvação na cabeça da menina, destrinchada em uma única chance dada à Fanning, são exemplos de oportunidades perdidas, mas Zoe Saldana mal tem no que se escorar com o seu papel. Simplificada como uma bela contrabandista que não deixa de realizar suas ações de caridade, Graciela é capturada, em duas ocasiões, em planos bem fetichistas, com a câmera de Affleck mostrando-a por trás e destacando “as curvas do seu corpo”.

Assim como a quantidade de personagens mal aproveitados, A Lei da Noite deixa de aprofundar em questões interessantes sobre a formação dos Estados Unidos tratadas ao longo da narrativa. O puritanismo que marcou a fé cristã que desembarcou ainda no período colonial ainda como esteio dessa nação feita por imigrantes, mas que não os “abraça”: se os latinos de Miami são discriminados, também semeiam a discriminação entre eles por causa de sua origem, assim como a questão racial fica – e está – longe de ser solucionada com a segunda formação e onda de ataques da Ku Klux Klan retratada aqui. A história trazida por Lehane em suas páginas e, coincidentemente, por Bem às telas é tão rica e complexa que, ao final, fica a dúvida se a obra não caberia em um formato mais longo, uma minissérie que desse conta do retrato dos Coughlin como representação do sonho americano e suas fissuras.

 

A Lei da Noite (Live by Night, 2016)

Duração: 129 min | Classificação: 14 anos

Direção: Ben Affleck

Roteiro: Ben Affleck, baseado no livro “Os Filhos da Noite”, de Dennis Lehane

Elenco: Ben Affleck, Elle Fanning, Chris Messina, Remo Girone, Brendan Gleeson, Robert Glenister, Sienna Miller, Zoe Saldana, Chris Cooper, Matthew Maher e Miguel (veja + no IMDb)

Distribuição: Warner Bros. Pictures

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